sexta-feira, 23 de abril de 2010
Direito ao voto.
Leis que não se aplicam, leis que são ignoradas por instâncias que deveriam aplicá-la viram ficção. Além disso, desmoralizam a própria sociedade onde vigem.
O Direito, sabe-se, não cria a realidade; esta é que cria o Direito. As leis, portanto, apenas regulam situações correntes no âmbito social. Sempre foi assim.
Pois uma lei que fica esquecida, que não é posta em prática por ninguém e nenhuma instância, quando o caso concreto se manifesta, representa o desprezo absoluto à necessidade da interferência no Estado para mediar conflitos.
Isso vale - muito mais, aliás - para os dipositivos inscritos na Constituição de qualquer país. Como na do Brasil, por exemplo, abrigo de verdadeiras ficções que já viraram até motivo de deboche.
Agora mesmo, liminar expedida pela Justiça Federal no Pará que barrou leilão da hidrelétrica de Belo Monte - decisão posteriormente derrubada - amparou-se na falta de regulamentação de um artigo da Carta Magna por lei ordinária para determinar que não seria possível o início do empreendimento.
Outro caso é clamoroso e, ao mesmo tempo, deplorável. É clamoroso porque sua repercussão é ampla, de dimensões nacionais. É deplorável porque representa o desprezo ao que a Constituição Federal determina.
Trata-se do direito que presos provisórios e adolescentes que cumprem medida socioeducativa em instituições especializadas têm, de votar em processos eleitorais.
Atualmente, há 150 mil provisórios e 5 mil adolescentes em conflito com a lei em todo o País. Mas eles não votam, muito embora a Constituição Federal preveja que somente os presos com condenação transitada em julgado terão seus direitos políticos suspensos.
Já não era sem tempo, dessa forma, que se adotassem medidas para dar eficácia ao dispositivo constitucional. Tal iniciativa se concretiza agora, com a celebração de acordo de cooperação técnica assinado pelo Conselho Nacional de Justiça com o Ministério da Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral e outros órgãos e entidades.
Uma das medidas será acompanhar a instalação, pela Justiça Eleitoral, das seções eleitorais especiais nos estabelecimentos penais e nas unidades de internação de adolescentes em conflito com a lei.
Também serão organizados mutirões para a obtenção de documentos de identificação dos adolescentes e mobilizará servidores e voluntários que vão trabalhar como mesários durante as eleições.
O direito de votar, estendido a presos provisórios e menores infratores, vai muito além da obediência à Constituição. É providência que garante, efetivamente, o exercício de um dos principais direitos de cidadania a cerca de 150 mil de pessoas, que, por razões outras que não a garantia legal, sempre foram impedidas de exercer esse direito de forma plena.
O ministro Ayres Britto, do TSE, observou que a eficácia que se atribui a esse dispositivo significa, na prática, retirar a Constituição do papel, trazê-la para o cotidiano, afastar omissões que a tornam, frequentemente, peça de ficção. 'O TSE se sente muito orgulhoso de participardesse esforço coletivo de reconhecimento de direitos fundamentais de pessoas que não podem ficar à margem desse processo de tonificação e vitalização da nossa democracia', ressalta o ministro.
A democracia, de fato, não se tonifica e nem se revitaliza apenas com promessas, com teses, com proclamações apaixonadas de que é o regime das liberdades.
É preciso que se criem condições objetivas para o seu exercício, sem o que a democracia não passará de ficção.
E a democracia também continuará sendo uma rematada ficção se não permitir uma participação política das mais amplas, garantindo ao sistema democrático maior legitimidade.
Fonte: O Liberal.
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